O Fazedor de Imagens: Entre Vaga-lumes e Pirilampos Performar e Imaginar no Campo da Imagem
[…] criar imágenes es un ejercicio que demanda sostener situaciones de no saber […]
Andrea Soto Calderón, Imaginación Imaterial.
Referências Bibliográficas
• Didi-Huberman, Georges. Sobrevivência dos vaga-lumes. Traduzido por Vera Casa
Nova. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011.
• Nietzsche, Friedrich. A genealogia da moral. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
• Soto Calderón, Andrea. Imágenes que resisten: la genealogía como método crítico.
Barcelona: Ayuntamiento de Barcelona, 2023.
• Glissant, Édouard. Poéticas da Relacionalidade. São Paulo: Editora UFMG, 2011.
• Flusser, Vilém. Filosofia da Caixa Preta. 1. ed. São Paulo: Editora UFMG, 1985..
• Matéria leve. 2024. Projeto coordenado por Leticia Skrycky e Carolina Campos.
https://www.materialeve.com.
O linóleo está coberto por uma camada de serragem, mostra um rastro de uma coisa que passou por ali mas não sei definir. Sinos tocam, aos poucos uma tom neon acido começa a habitar o espaço. Sempre que praticamos situações de luz sinto que sou atravessado e arrastado para memórias infantis. Não sei dizer se esse território que vejo é pouco convidativo a estar em ou se não avanço por timidez, me apego nas lembranças da marcenaria que tinha na esquina da casa da minha avó. Nuances de cores de dia e por do sol. Uma música toca, cantada em outras vozes que nunca ouvi, mas conheço essa melodia, tento mais uma vez habitar esse espaço acido, me deito no chão enquanto sinto vontade de cantarolar. Segundo momento de ver esse espaço de luz ativado por performers, agora assistimos sentades na primeira fila. Carolina se posiciona lado esquerdo da cena, linóleo preto, dayligth. A paisagem que observo daqui é outra. Carolina veste um macacão e na parte do troco são madeixas bem comprimidas de texturas e cores variadas, uma peruca costurada em memória. Ela começa a narrar e entra a segunda performer em cena com uma sacola amarela na mão, também vestindo um macacão peruca. Enquanto Carol nos informa e convida a segunda pessoa começa a espalhar com as mãos a serragem que está na sacola, daqui parece areia de praia. Elas fitam os microfones, levantam, nos olham, se colocam em posição quadrúpede, costas nuas e as madeixas quase arrastando pelo chão. A luz é tão árida, desértica, esse animais híbridos caminham pela serragem deixando um rastro, as vezes me perco no texto, mas estou completamente com elas. De alguma maneira esse convite me coloca num deserto de imaginação.
Hoje nos deitamos no meio do palco, numa tentativa de olhar para o nosso gesto de luz, me questiono que sensações estamos a compor. Daqui do chão não consigo ter a noção do espaço, me levanto, tento sair do olhar técnico me fazer espectador. O importante não é a forma da imagem mas o modo como ela reorganiza os espaços. Como revelar espaços para despertar memórias, fragmentos, labirintos visuais. Aprender a firmar os olhos, insistir no olhar… insistir no olhar… derreter dissolver, compor a volta. Dentro desse processo vamos ajustando, colando fitas nas fissuras criadas pelo atrito do gesto...
acontecimento ético – mobiliza o sensível como resposta
acontecimento da imagem - em que corpo, luz e olhar se cruzam num espaço de intensidade sensível
alimentar sensibilidade – cultivar a escuta e o afeto como força
analogico – matéria contínua, vibrátil
anarquivo – suspensão, que escapa à ordem, plasticidade da memória, fabulações
aparição – imagem que não se fixa em representação, entre presença
aparatos – mecanismos que mediam o ver, o ouvir e o sentir
arquivo de encontros– acúmulo, território onde os afetos se inscrevem
arquitetura – a forma como o espaço se torna habitável e relacional
ausência – presença latente, que não se dá na visibilidade mas na potência de ser sentida
brechas – olhar por onde o sensível escapa
caixa preta - Flusser
casa – espaço da subjetividade, abrigo do devaneio e da memória
caos – sistema onde a ordem não se mostra evidente
coleção de gesto – coreografia do cotidiano, acervo sensível do movimento
composição – costura de formas
convite – abertura para o entre
corpo – superfície sensível e política; lugar de atravessamentos
developer – aquele que expande
devaneio – movimento do pensamento que escapa à lógica
dimmer – dimensão, modulador
dispositivo – aquilo que molda o que pode ser visto
dissidentes – temporalidades que tencionam a estrutura dominante
eclipse – apagamento parcial
empatia geométrica – escuta que opera em múltiplas direções, conexão que se dá por formas e ritmos compartilhados.
escuta – prática de atenção radical
estrutura – base de um lugar ou modo de fazer
exaustão – onde a imagem perde força de invenção
fabulação – produção de realidades outras
fantasmagoria –
fazedor de imagem – despertador de curiosidade
fenomênica – campo da experiência direta, anterior à nomeação.
ficções – narrativas possíveis que tencionam a realidade instituída.
fissura – acidente do tempo
forma – aparência visível de algo
fragmento – vestígio que resiste
imagem território – zona de interpenetração entre corpo, espaço e luz, campo de presença
imaginar – gesto radical de existência
inacabado – processo em fluxo, resistência ao fixo
Infraexistência – modos de vida que operam abaixo do radar da visibilidade hegemónica.
intermitência – ritmo da aparição, pulsação do ver.
lampejos – brilhos efémeros que marcam a imagem
linguagem – dispositivo que constrói e atravessa
lugar – mais que um espaço físico, é o que se atravessa com o corpo e o tempo
máquina de imaginar – dispositivo de fabulação e reinvenção
materialidade – o corpo do que se forma
minuciosidade – atenção ao detalhe
montagem – articulação de tempos e espaços dissonantes
negra oficina - Nietzsche
parafernália – conjunto de dispositivos técnicos e simbólicos que constroem a cena
performar – compor paisagens
performatividade – potência de criar mundos no próprio modo de fazer
plano – camada, superfície ou campo de inscrição do acontecimento
povo vagalume – coletivo, comunidade da invenção
precisão – exatidão
prática – modo de fazer que se repete, mas nunca igual, exercício ético-estético.
projetores – tecnologias do ver.
rastro – presença do que já passou e ainda pulsa.
relações – forças que operam entre
representação – limite da imagem que se encerra em si
sensações – o que acontece no corpo e no tempo
silêncio –pausa que sustenta a escuta.
situação de atenção – estado de presença
estrutura – a espinha dorsal do fazer, ancorar ou se tensionar.
tensionar – colocar em atrito, fazer vibrar
território performático – campo de ações e presenças
temporalidade – tempo vivido, esticado, suspenso, ritmo da imagem
um tubo de papel cartão, dez estenopos feitos sem rigor, um papel fotosensível velado. Como regra desse exercício fotográfico performático um dos lados do tubo é fechado com a mão do operador. Foram três momentos onde cada performance teve um tempo distinto de exposição, a mais longa foi de trinta minutos.